Antígona BR – uma genética da tragédia
Por André venzon – artista plástico
Por André venzon – artista plástico
12.06.08
Antígona BR, nova montagem do Grupo Caixa-Preta que estreou no Theatro São Pedro e fez temporada recente no Renascença em Porto Alegre, revela-nos a genética de uma tragédia. Anunciam a universalidade deste mito tebano no abrir das cortinas em vários idiomas e renovam esta trágica história preservando sua complexidade. Exploram a sensualidade total dos elementos cênicos e personagens. O elenco, jovem e exuberante, abusa da sensualidade no corpo dos atores-bailarinos-cantores. As cenas parecem ter sido pintadas quando revelam um cromatismo rico, sem cometer excessos, com soluções tão criativas quanto poéticas – como as transferências dos personagens da tragédia tebana em orixás da cultura afro-brasileira, ou a planta “espada de São Jorge” usada na mão dos guerreiros em combate no lugar daquela arma. Bem como o nó, unindo os vestidos de Antígona em Iansã que sugere dois destinos... O sincretismo religioso e a mistura de estilos plásticos; o flerte com o musical; o episódio da santificação de Antígona; o ar evangélico do Creonte pastor; o fogo, as velas, a água e a água-de-cheiro, o momento sublime quando o corpo de Eteocles “caminha no ar” tem aspecto divino com iluminação perfeita. Podemos perceber que, o mito, principalmente assim, tão próximo da realidade, é recriado pelo trabalho de direção, que confere a tragédia elementos de comédia, manipulando e construindo, com contra-regras em cena, num jogo de posição e oposição a história. A voz de Antígona, por outro lado, revela mais do que o sucesso na escolha do texto para atriz, destaca uma estrela em brilho ascendente. O desenho dos corpos dos irmãos Polinice (Wagner Santos) e Eteócles (Éderson Santos), também associados a orixás, Cosme e Damião, ou Ode e Ogum, respectivamente, no jogo de capoeira, na luta-investidura revela uma beleza clássica. Só há uma explicação para tanta qualidade, à pesquisa de direção de Jessé Oliveira e a capacidade técnica e carga emocional empregada pelo elenco, o que retumba no extenso do espetáculo. A dança das iaôs e a sutileza camaleoa dos vestidos-saias – axós - que mudam do colorido para o azul, preparando o ritual para Iemanjá. Os figurinos têm ao mesmo tempo unidade, exemplo da cena com Os Sete Contra Tebas, e contraste entre os deuses e o cidadão comum, protagonistas e coro de anciãs, que ao mesmo tempo apresentam características de velha-guarda de escola de samba e de velhas carolas, resulta numa imagem mais próxima do povo atual. Na cena do enterro do corpo de Polinice, a solução dos jornais que simbolicamente o cobrem – e logo depois – no desfecho do espetáculo, são também os veículos para estampar a tragédia, das sucessivas mortes que selam o fim do reinado de Creonte. A platéia é participante no momento dos doces (balas) que são jogadas como oferendas pelos irmãos Cosme e Damião.
Há verde, azuis, vermelho e branco na composição cromática do espetáculo, as guias são acessórios que tem uma carga, uma força tão expressiva que os personagens só precisariam usá-los para se sentir vestidos. A propósito, a cena em que o filho de Creonte, Hemon (Diego Neimar) tira a roupa, que já destoa desde sua entrada, sugere muito bem, a sensualidade na transformação do corpo, primeiramente, pelo traje camuflado de guerra, logo o ator poderia se quisesse vestir só as guias nas cores do arco-íris que o identificam como Oxumaré (Orixá que é seis meses homem, seis meses mulher) não fosse a necessidade dos panos, com suas estampas e padrões característicos, marcando uma singularidade, assim como as cores e a quantidade de contas nas voltas das guias.
Estamos diante de um espetáculo pensado com uma capacidade absoluta de relacionar o que temos de mais primitivo e mais contemporâneo, sem fazê-lo de forma irreconhecível, abstrata, nem incompreensível e hermética, a desordem própria característica do nascimento do mito, é revista de forma eclética, mesclada a signos da cultura afro-brasileira, o que revela também um índice universal da cultura ocidental a ser reconhecido.
Antígona BR, nova montagem do Grupo Caixa-Preta que estreou no Theatro São Pedro e fez temporada recente no Renascença em Porto Alegre, revela-nos a genética de uma tragédia. Anunciam a universalidade deste mito tebano no abrir das cortinas em vários idiomas e renovam esta trágica história preservando sua complexidade. Exploram a sensualidade total dos elementos cênicos e personagens. O elenco, jovem e exuberante, abusa da sensualidade no corpo dos atores-bailarinos-cantores. As cenas parecem ter sido pintadas quando revelam um cromatismo rico, sem cometer excessos, com soluções tão criativas quanto poéticas – como as transferências dos personagens da tragédia tebana em orixás da cultura afro-brasileira, ou a planta “espada de São Jorge” usada na mão dos guerreiros em combate no lugar daquela arma. Bem como o nó, unindo os vestidos de Antígona em Iansã que sugere dois destinos... O sincretismo religioso e a mistura de estilos plásticos; o flerte com o musical; o episódio da santificação de Antígona; o ar evangélico do Creonte pastor; o fogo, as velas, a água e a água-de-cheiro, o momento sublime quando o corpo de Eteocles “caminha no ar” tem aspecto divino com iluminação perfeita. Podemos perceber que, o mito, principalmente assim, tão próximo da realidade, é recriado pelo trabalho de direção, que confere a tragédia elementos de comédia, manipulando e construindo, com contra-regras em cena, num jogo de posição e oposição a história. A voz de Antígona, por outro lado, revela mais do que o sucesso na escolha do texto para atriz, destaca uma estrela em brilho ascendente. O desenho dos corpos dos irmãos Polinice (Wagner Santos) e Eteócles (Éderson Santos), também associados a orixás, Cosme e Damião, ou Ode e Ogum, respectivamente, no jogo de capoeira, na luta-investidura revela uma beleza clássica. Só há uma explicação para tanta qualidade, à pesquisa de direção de Jessé Oliveira e a capacidade técnica e carga emocional empregada pelo elenco, o que retumba no extenso do espetáculo. A dança das iaôs e a sutileza camaleoa dos vestidos-saias – axós - que mudam do colorido para o azul, preparando o ritual para Iemanjá. Os figurinos têm ao mesmo tempo unidade, exemplo da cena com Os Sete Contra Tebas, e contraste entre os deuses e o cidadão comum, protagonistas e coro de anciãs, que ao mesmo tempo apresentam características de velha-guarda de escola de samba e de velhas carolas, resulta numa imagem mais próxima do povo atual. Na cena do enterro do corpo de Polinice, a solução dos jornais que simbolicamente o cobrem – e logo depois – no desfecho do espetáculo, são também os veículos para estampar a tragédia, das sucessivas mortes que selam o fim do reinado de Creonte. A platéia é participante no momento dos doces (balas) que são jogadas como oferendas pelos irmãos Cosme e Damião.
Há verde, azuis, vermelho e branco na composição cromática do espetáculo, as guias são acessórios que tem uma carga, uma força tão expressiva que os personagens só precisariam usá-los para se sentir vestidos. A propósito, a cena em que o filho de Creonte, Hemon (Diego Neimar) tira a roupa, que já destoa desde sua entrada, sugere muito bem, a sensualidade na transformação do corpo, primeiramente, pelo traje camuflado de guerra, logo o ator poderia se quisesse vestir só as guias nas cores do arco-íris que o identificam como Oxumaré (Orixá que é seis meses homem, seis meses mulher) não fosse a necessidade dos panos, com suas estampas e padrões característicos, marcando uma singularidade, assim como as cores e a quantidade de contas nas voltas das guias.
Estamos diante de um espetáculo pensado com uma capacidade absoluta de relacionar o que temos de mais primitivo e mais contemporâneo, sem fazê-lo de forma irreconhecível, abstrata, nem incompreensível e hermética, a desordem própria característica do nascimento do mito, é revista de forma eclética, mesclada a signos da cultura afro-brasileira, o que revela também um índice universal da cultura ocidental a ser reconhecido.
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